Viewing Room / MAAT, Daniel Blaufuks “the days are numbered” (17 July – 7 October)

Daniel Blaufuks has worked on the relationship between public and private memory, a constant theme of inquiry in his work as a visual artist, pursued chiefly through photography and video and presented in installations, books and films. In 2007, he published Sob Céus Estranhos (Tinta-da-china) – based on his film Under Strange Skies from 2002 – which earned him the award for best photography book of the year in the international category at PhotoEspaña. He was also awarded a prize in 2007 for his work about a concentration camp in the Czech Republic, additionally presented in the book Terezín (Steidl, 2010) and the film As If (2014).
 
In 2016, he won the AICA/MC/Millennium BCP Visual Arts Award for the exhibitions Attempting Exhaustion and Léxico. More recently, he has published Não Pai (Tinta-da-china, 2019) and Lisboa Clichê (Tinta-da-china, 2021). He has a PhD from the University of Wales, for which he wrote his thesis on the relationship of photography and cinema to the work of W. G. Sebald and Georges Perec and to the themes of memory and the Holocaust. His films – “expanded photographs” – have been shown at various film festivals and his latest works examine the resistance to German occupation in Brittany and colonialism in São Tomé and Príncipe.

Daniel Blaufuks tem trabalhado sobre a relação entre a memória pública e a memória privada, um tema que é uma das constantes interrogações no seu trabalho como artista visual, recorrendo principalmente à fotografia e ao vídeo e apresentando-o em instalações, livros e filmes. Em 2007, publicou Sob Céus Estranhos (Tinta-da-china) – baseado no seu filme de 2002 com o mesmo título –, que lhe valeria o prémio de melhor livro de fotografia na PhotoEspaña. Foi também premiado em 2007 pelo seu trabalho sobre um campo de concentração na República Checa, também apresentado no livro Terezín (Steidl, 2010) e no filme As If (2014).
 
Em 2016, recebeu o prémio AICA pelas exposições Tentativa de Esgotamento e Léxico. Mais recentemente, publicou Não Pai (Tinta-da-china, 2019) e Lisboa Clichê (Tinta-da-china, 2021). É doutorado pela University of Wales, com uma tese sobre fotografia e cinema em relação com as obras de W. G. Sebald e Georges Perec, e com os temas da memória e o Holocausto. Os seus filmes – “fotografias expandidas” – têm sido apresentados em diversos festivais de cinema e os seus trabalhos mais recentes abordama resistência à ocupação alemã na Bretanha e o colonialismo em São Tomé e Príncipe.

 
 
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This diary is the perfect example of the work Daniel Blaufuks undertakes in all of his prior or parallel photographic and video works. In simple, horizontally placed sheets of A4 paper, the artist numbers the days/years as they pass by. Onto them he glues instant photographs (rarely more than one or two per page) and a few cut-outs from newspapers and magazines, adding handwritten or stamped phrases (often his own or quotations without any reference to the author or source) in the languages he is most fluent in (English, German, Portuguese and French). There is rarely any explanatory logic to the relationship between these different elements – their autonomy is only constrained by the visual composition, and each “day” imposes a pronounced poetic freedom in which the power of the written word often underpins the repetitive ordinariness of the images.

Este diário é exemplo maior da tarefa que Daniel Blaufuks cumpre em todos os seus trabalhos de fotografia e vídeo anteriores ou paralelos. Em simples folhas A4, colocadas ao baixo, o artista numera os dias/anos que vão passando. Cola nelas fotografias instantâneas (raramente mais do que uma ou duas por página), alguns recortes de jornais e revistas, e manuscreve ou carimba, nas línguas que melhor domina (inglês, alemão, português, francês), algumas frases (muitas vezes suas, ou então citadas sem referência à autoria ou origem). Raramente estes diferentes elementos se relacionam segundo lógicas explicativas – a autonomia de cada um é apenas condicionada pela composição visual, e cada “dia” impõe uma marcada liberdade poética onde o poder da palavra escrita sustenta, muitas vezes,a banalidade repetitiva das imagens.

 
 
“A diary is also an act of resistance.” –Daniel Blaufuks
 
“Um diário é também um acto de resistência.” – Daniel Blaufuks

 
We created time and immediately felt hemmed in and devoured by it. Memory is a betrayal of time. We have always tried, without success, to escape it, to negate its erosive influence – a Sisyphean task in which Blaufuks, who exposes to the world the weight of the myriad epochs and memories (family, personal, historical, political, cultural, …) he carries, participates.

Criámos o tempo e logo nos sentimos cercados e devorados por ele. A memória é uma traição ao tempo. Tentamos, desde sempre e sem sucesso, fugir-lhe, anular o seu trabalho de erosão. Daniel Blaufuks que, transportando consigo e expondo ao mundo o peso de múltiplos tempos e memórias (familiares, pessoais, históricas, políticas, culturais, …), participa dessa tarefa de Sísifo.

According to the artist, keeping the diary (begun in May 2018) has become a life-long task. Shown here are the entries from 2023 alongside a selection of days from previous years and the first few months of 2024. By exposing his memory, his own days and those of the world around him intersect. The artist reacts to his surroundings, fighting time’s voracious race against things. He may not cancel it out, but at least he retards it, delaying their erasure. But it is significant that he calls this work a “non-diary”, and that he refers to the faces of some of the interlocutors he puts on these pages as “non-portraits”. This double negative classification is a confession of impotence that exposes the inevitable contradiction of all memory records – that they are destined to be forgotten.

 
A elaboração do diário (iniciado em maio de 2018 e de que aqui se expõe o ano de 2023, alguns dias de anos anteriores e, ainda, os primeiros meses de 2024) passou a ser, segundo Daniel Blaufuks, tarefa de uma vida. Expondo a sua memória, cruzam-se os seus dias e os dias do mundo. O artista reage ao que o rodeia lutando contra a voraz corrida do tempo sobre as coisas. Se não anula, pelo menos retarda o tempo, adiando o apagamento das coisas; mas é significativo que nomeie esta obra como um “não-diário”, e que se refira a “não-retratos” quando fala dos rostos de alguns dos interlocutores que fixa nessas páginas. Esta dupla classificação negativa é uma confissão de impotência que expõe a inevitável contradição de todos os registos de memória – a de que o seu destino é o esquecimento.

In the inexorable productivist accounting of time (that shredder of lives) “days are numbered”; but what occurred in them or what Daniel Blaufuks retains from them is reduced to an image devoid of identity, a “subject-less” phrase or a context-free fact (personal or collective). Losing, often almost immediately, their value as testimonies of any identifiable historical period, these images are part of a process of collective and programmed amnesia. Individually or jointly, the diary’s pages assert themselves more as successive states of mind vis-à-vis the manifestation of the eternal return of things, of seasons, of places, of facts… Before the predictability of the domestic scenarios, marked by the repetitive presence of a table and a window, where the circular movement of the light marks the time and the wilting of the flowers the days; and before the vertiginous carousel of his journeys, between the mundanity of wars and injustice and the marking of certain more notable political and cultural events, one witnesses the inexorable death of Blaufuks’ friends and heroes, the blossoming of water lilies in his garden and his ghostly exposure.

Na inexorável contabilidade produtivista do tempo (essa máquina trituradora de vidas), “os dias estão numerados”; mas o que neles se passou ou o que deles Daniel Blaufuks retém fica reduzido a uma imagem sem identidade, a uma frase “sem sujeito” ou a um facto (pessoal ou coletivo) sem contexto. Perdendo, muitas vezes quase imediatamente, o valor de um testemunho situável numa linearidade historicista, essas imagens integram um processo de amnésia coletiva e programada. Individualmente ou em conjunto, as páginas deste diário afirmam-se antes como uma sucessão de estados de espírito perante a manifestação do eterno retorno das coisas, das estações, dos lugares, dos factos… Face à previsibilidade dos cenários domésticos, marcados pela repetitiva presença de uma mesa e de uma janela, onde o rodar da luz marca as horas e o declinar das flores os dias; perante o carrossel vertiginoso das suas viagens, entre a banalidade das guerras e injustiças e o assinalar de alguns factos políticos e culturais mais notáveis, assistimos à morte inexorável de amigos seus e de heróis, ao despertar dos nenúfares no jardim, à exposição fantasmática do artista.

 
the days are numbered
 
Published by Tinta da China and JBE Books
The book is available online, at the museum bookstore and at the gallery.

 
We create time, but it soon overpowers and devours us. Memory is our way of trying to trick time; attempting to evade it, trying to undo the erosion of this dark water that corrupts from within the salt statues of our lives,our achievements, our views of the world. – João Pinharanda, in the book The Days Are Numbered
 
“Criamos o tempo e logo nos sentimos cercados e devorados por ele. A memória é uma traição ao tempo. Tentamos, desde sempre e sem sucesso, fugir-lhe, anular o trabalho de erosão dessa água escura que corrói por dentro as estátuas de sal das nossas vidas, das nossas obras, das imagens que temos do mundo.” – João Pinharanda, no livro Os Dias Estão Numerados

Daniel Blaufuks, the days are numbered
 
Curated by / Curadoria de João Pinharanda
MAAT Museum
17.07.24 – 7.10.24
 
Text excerpts by João Pinharanda / Excertos do texto de João Pinharanda
Link to the exhibition guide / Link para guia da exposição 

BIO
 
Daniel Blaufuks has worked on the relationship between public and private memory, a constant theme of inquiry in his work as a visual artist, pursued chiefly through photography and video and presented in installations, books and films. In 2007, he published Sob Céus Estranhos (Tinta-da-china) – based on his film Under Strange Skies from 2002 – which earned him the award for best photography book of the year in the international category at PhotoEspaña. He was also awarded a prize in 2007 for his work about a concentration camp in the Czech Republic, additionally presented in the book Terezín (Steidl, 2010) and the film As If (2014). In 2016, he won the AICA/MC/Millennium BCP Visual Arts Award for the exhibitions Attempting Exhaustion and Léxico. More recently, he has published Não Pai (Tinta-da-china, 2019) and Lisboa Clichê (Tinta-da-china, 2021). He has a PhD from the University of Wales, for which he wrote his thesis on the relationship of photography and cinema to the work of W. G. Sebald and Georges Perec and to the themes of memory and the Holocaust. His films – “expanded photographs” – have been shown at various film festivals and his latest works examine the resistance to German occupation in Brittany and colonialism in São Tomé and Príncipe.

Daniel Blaufuks tem trabalhado sobre a relação entre a memória pública e a memória privada, um tema que é uma das constantes interrogações no seu trabalho como artista visual, recorrendo principalmente à fotografia e ao vídeo e apresentando-o em instalações, livros e filmes. Em 2007, publicou Sob Céus Estranhos (Tinta-da-china) – baseado no seu filme de 2002 com o mesmo título –, que lhe valeria o prémio de melhor livro de fotografia na PhotoEspaña. Foi também premiado em 2007 pelo seu trabalho sobre um campo de concentração na República Checa, também apresentado no livro Terezín (Steidl, 2010) e no filme As If (2014). Em 2016, recebeu o prémio AICA pelas exposições Tentativa de Esgotamento e Léxico. Mais recentemente, publicou Não Pai (Tinta-da-china, 2019) e Lisboa Clichê (Tinta-da-china, 2021). É doutorado pela University of Wales, com uma tese sobre fotografia e cinema em relação com as obras de W. G. Sebald e Georges Perec, e com os temas da memória e o Holocausto. Os seus filmes – “fotografias expandidas” – têm sido apresentados em diversos festivais de cinema e os seus trabalhos mais recentes abordam a resistência à ocupação alemã na Bretanha e o colonialismo em São Tomé e Príncipe.

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